sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Cem prisões domiciliares são revogadas por novo juiz

Antigo magistrado, que está preso, havia concedido benefício a 800 detentos; Vara ainda faz revisão de outros documentos
Por Daniela Arbex
Daniela Arbex
Juiz Daniel Réche já conseguiu revisar metade dos oito mil processos em andamento na Vara

Cerca de cem prisões domiciliares, das 800 concedidas nos últimos anos pelo juiz Amaury de Lima e Souza, foram revogadas pelo novo titular da Vara de Execuções Criminais de Juiz de Fora (VEC), Daniel Réche Motta, 32 anos. O magistrado, que assumiu a vaga na cidade em 26 de junho, em plena crise que levou Amaury à prisão após investigação da Polícia Federal sob suspeita de vender sentenças para beneficiar traficantes, adiantou que as decisões foram motivadas por situações nas quais o beneficiado pela domiciliar cometeu algum delito durante o cumprimento da medida, ou em que a concessão do benefício foi considerada inadequada.
Além das revogações, o atual juiz identificou que 400 entre os 3.900 sentenciados estavam em situação irregular, o correspondente a 10% do total. Metade deles tinha a sua situação jurídica desconhecida, a qual o juiz classificou de “limbo jurídico”. Os outros 50% eram referentes aos detentos com benefícios vencidos, com direito, por exemplo, a progressão de regime, ao livramento condicional, à saída temporária ou em condição de ingressar no regime aberto.
Dos oito mil processos em andamento na VEC, quase quatro mil já foram revistos, segundo Réche. Algumas dezenas estão sob análise da Corregedoria de Justiça. O objetivo do órgão é descobrir a motivação de sentenças assinadas por Amaury.
Além de cinco servidores do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que trabalham na vara, outros funcionários da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), em Belo Horizonte, foram enviados para Juiz de Fora, a fim de colaborar com a reestruturação da Execuções Criminais. O objetivo é tentar agilizar a revisão dos processos. A tarefa é considerada um desafio para o magistrado que passou no concurso em 2010 e atuava na Comarca de Leopoldina antes de ser recrutado para a VEC. “Eu já estava cooperando aqui nas varas criminais e no Tribunal do Júri uma ou duas vezes por semana. Gosto muito de execução e também de Juiz de Fora. Só queria que as circunstâncias tivessem sido outras”, diz, referindo-se à investigação que resultou na prisão do antigo juiz e de uma quadrilha responsável pelo tráfico de drogas em vários estados do país.
Busca de agilidade
Além da mudança de titular, a estrutura física da VEC também sofreu alterações. A sala do juiz que antes era “blindada” e cercada por câmeras de segurança, agora foi aberta e adequada para receber dois estagiários e uma assessora. Os processos também foram separados por temas, na busca de agilidade. “No caso dos mandados de prisão, queremos saber se estão corretos ou se há casos em que houve prescrição. Também estamos verificando o cumprimento da pena restritiva de direitos. Nossa ideia é olhar tudo. Todos as oito mil ações serão revistas, já que o processo de execução é muito singular e uma das peculiaridades dele é que o juiz pode agir de ofício. Aqui o sentenciado e a família fazem pedido sem precisar de advogado. Quando eu cheguei aqui, encontrei diversos casos em que não concordava com as decisões. O problema era muito maior do que uma situação localizada. Tinha-se um problema de secretaria, às vezes de cumprimento de despacho, então eu tive que rever tudo”, explica Réche.

Falta estrutura para cumprir regime aberto

A ausência de infraestrutura para o cumprimento regular da pena de regime aberto ficou evidente com o fechamento da Casa do Albergado. O local oferecia 70 vagas, mas o número de sentenciados era quase cinco vezes maior. Na tentativa de buscar isonomia, o regime aberto foi transformado em prisão domiciliar na cidade, embora a fiscalização não consiga dar conta dos 800 casos. Ao contrário das penas restritivas de direito, nas quais há um controle integral por meio do Centro de Apoio para o Cumprimento de Penas Alternativas (Ceapre), na domiciliar, o controle do cumprimento da medida é indireto. Embora o sentenciado tenha o compromisso de comparecer ao Ceapre por meio de quatro encontros mensais, isso não é garantia de que as regras da domiciliar estão sendo cumpridas.
“Na prisão domiciliar, o preso tem que se recolher entre 21h e 6h. Como vamos saber que o indivíduo não está lá? Só se ele se envolver em um acidente de trânsito ou se estiver envolvido em um crime. O juiz, no entanto, pode a qualquer momento determinar a um oficial de Justiça que vá ao endereço para checar. Nós temos uma ajuda muito grande nisso também das unidades prisionais e do serviço de inteligência, pois não conseguimos controlar todos os casos”, admite o juiz da Vara de Execuções Criminais, Daniel Réche Motta.
Atualmente, a Casa do Albergado foi transformada em anexo da Penitenciária José Edson Cavalieri, no Bairro Linhares, para o cumprimento do regime semiaberto, que inclui convênio de trabalho com o Demlurb.

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