quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Guarda Municipal de JF desaparelhada

Motos sucateadas, sprays vencidos, coletes insuficientes são alguns dos problemas; Secretaria diz que tem atendido pleitos da categoria
 
Por DANIELA ARBEX
Pelo menos duas motocicletas estão sem condições de uso
Pelo menos duas motocicletas estão sem condições de uso

Sede da Guarda Municipal tem mobiliário antigo e banheiro interditado
Sede da Guarda Municipal tem mobiliário antigo e banheiro interditado

Criada por lei em 2006, com a função de zelar pelo patrimônio público, bem como colaborar com as polícias Civil e Militar do Estado nas políticas de segurança pública, a Guarda Municipal de Juiz de Fora está desaparelhada, tendo o desafio diário de atuar sem equipamentos mínimos. Uma das armas do grupo, o spray de pimenta, teve a validade do último lote vencida em junho deste ano e ainda não foi substituída. Além disso, as equipes estão trabalhando sem rádio desde março, um dos instrumentos mais importantes para garantir comunicação rápida em situações de emergência e risco. Outro problema diz respeito à frota de veículos. Pelo menos duas das seis motos estão sucateadas e paradas na sede da instituição. Além disso, todas as três viaturas que serviam aos guardas até a semana passada eram descaracterizadas, o que dificultava o reconhecimento, por terceiros, de algum tipo de autoridade. Com a devolução dos carros para a empresa que alugava os veículos, já que ela perdeu recentemente a licitação, as novas viaturas disponibilizadas temporariamente não possuem giroflex. Até os coletes balísticos, que configuram como equipamento individual de proteção (EPI), são compartilhados. De acordo com a secretária de Administração e Recursos Humanos, Andréia Goreske, que também comanda a Guarda Municipal, uma nova frota está sendo montada, e a licitação para reposição dos sprays já foi realizada. A Prefeitura aguarda o envio dos materiais até o início de outubro.
Em comunicado enviado aos guardas pela SARH, o pregão eletrônico para a aquisição de um novo lote de spray de pimenta foi realizado no dia 10 de julho, “não apenas para repor o equipamento até então disponibilizado, mas para buscar, dentro do avanço tecnológico, as melhores alternativas para os profissionais da segurança pública”. Ainda segundo o comunicado, o pregão eletrônico contempla a aquisição de dois espargidores de agente pimenta para cada servidor. Um com sistema spray e o outro com jato em espuma. Para os guardas, no entanto, o anúncio da realização do pregão não é sinônimo de entrega imediata do equipamento. “Por que a Prefeitura esperou os nossos sprays vencerem para depois realizar licitação? Eles eram nossa única arma. O fato é que hoje os guardas estão perdidos na rua. O único equipamento de proteção que temos disponível, neste momento, é a tonfa (cassetete), incapaz de nos ajudar em ocorrências nas quais os autores estão armados. Apesar de termos sido treinados para portar arma de fogo, a guarda continua desarmada, e não conta nem com pistolas de condução elétrica. Infelizmente, nós não somos prioridade para o Município”, desabafou um guarda, que prefere ter o nome mantido em sigilo.
A titular da secretaria, Andréia Goreske, afirma que há um planejamento das ações para equipar a guarda e que, apesar de a Prefeitura ter triplicado o orçamento de 2014 destinado à corporação, com recursos na ordem de R$ 100 mil, a demora na aquisição dos materiais se deve à burocracia que envolve esse tipo de compra. “Já está tudo empenhado. Agora é uma questão de dias para eles receberem esses sprays. Tão logo recebam, eles terão um treinamento para usá-los”, diz. Ainda segundo a secretária, o planejamento foi anterior ao recolhimento dos sprays, mas a burocracia interna prejudicou a agilidade na reposição. “Por mais que a gente tivesse antecipado 90 dias do processo, a tramitação teve esse atraso”, explica Andréia. O chefe de Departamento da Guarda Municipal, tenente-coronel Almir Cassiano de Almeida, acrescentou que, como o spray é um produto controlado, a documentação só pode ser enviada ao Exército quando já há a empresa vencedora.
Quanto às críticas feitas pelos servidores, a secretária de Administração e Recursos Humanos garantiu que a categoria não está abandonada e que tem mantido diálogo aberto e permanente com a corporação, por meio da Associação da Guarda Municipal. Ela afirma que o Executivo tem apoiado os pleitos apresentados pela entidade. “Não tem faltado comunicação com a administração, o nosso papel é esse de dialogar. Estamos sempre levando as demandas da categoria para eles. As respostas para estas demandas cabem à Prefeitura”, confirma o presidente da Associação da Guarda Municipal, William Elias.

Compartilhamento de coletes é ‘constrangedor’

Em outro memorando interno, o 039/14, a Secretaria de Administração e Recursos Humanos (SARH) anuncia a aquisição de coletes a prova de balas para a corporação e avisa que o primeiro lote – somando 50 no total – será utilizado de forma compartilhada em alguns postos, “mas de maneira que todos os servidores disponham do seu equipamento no seu horário de trabalho”. A questão é controversa, já que, no mesmo documento, a Prefeitura reconhece que o colete é um equipamento de proteção individual (EPI). “Isso cria situações constrangedoras, porque os coletes que somos obrigados a compartilhar não são higienizados”, reclama outro servidor que não quer ser identificado por medo de retaliação.
A secretária Andréia Goreske ressaltou que a compra dos coletes caracteriza um “grande avanço”, pois eles não eram disponibilizados, e explica que, em função do orçamento disponível, não foi possível comprar o equipamento – avaliado em cerca de R$ 700 cada – para todos os servidores, o que deve acontecer na programação orçamentária de 2015. “Não conseguimos contemplar e atender a tudo. Não são todos os guardas que inicialmente precisam de colete, porque isso depende da ação, então tenho que priorizar.”
A precariedade nas condições de trabalho se estende à sede da corporação, localizada na Rua Professor Ernesto Evangelista, no Bairro São Bernardo. No prédio que abriga pelo menos 12 dos 115 servidores, o mobiliário está danificado e há vasos sanitários interditados, um deles desde 2013. As motos que ainda têm condições de rodar foram consertadas com peças retiradas das outras motocicletas.
A secretária admite problema em duas das seis motos, mas diz que a guarda está recebendo um Fiat Doblo para o trabalho na patrulha ambiental e mais quatro carros zero. “Perante a frota da Prefeitura e outras secretarias, a guarda vai estar muito bem equipada para suas necessidades.” Sobre a compra de novas motos, a secretária diz que esta demanda será contemplada no orçamento de 2015 e que uma pequena reforma na sede também está planejada. Já o subcomandante da Guarda Municipal, tenente-coronel Almir Cassiano de Almeida, disse que, mesmo com o sucateamento de duas motocicletas, o trabalho de motopatrulhamento não foi interrompido. Ele afirmou que, no próximo dia 22, acontecerá o pregão eletrônico para aquisição de novos rádios com tecnologia digital. “Isso faz parte de um planejamento escalonado da administração para poder atender todas as necessidades logísticas da Guarda Municipal.”
Periculosidade
O não pagamento do adicional de periculosidade, estimado em 30% do vencimento bruto do servidor, é outra queixa da categoria. Atualmente, a Prefeitura paga um adicional de desempenho em atividades de segurança pública de 20% do vencimento inicial do servidor de classe de Guarda Municipal I, o que representa R$ 322 a mais no salário de R$ 1.614,92. Se a periculosidade fosse adotada pelo Município, cada guarda receberia outros R$ 210 por mês. Segundo Andréia Goreske, um projeto de lei foi encaminhado à Câmara Municipal para alterar o adicional de desempenho de 20% para 25% a partir de janeiro. Ele também prevê a supressão de cláusula que corta o benefício em caso de falta no mês, mesmo que justificada por atestado médico. Quanto à reivindicação do adicional por periculosidade, a questão, de acordo com a secretária, está em análise no jurídico da Prefeitura.

Baixas são frequentes na corporação

A situação atual da categoria é considerada grave e resulta em dezenas de baixas no efetivo. De 2008, quando a corporação começou a funcionar, até agora, 35 pessoas das 150 concursadas deixaram a Guarda Municipal para seguir carreiras mais rentáveis e com melhores oportunidades. “Quando saí da guarda, há seis meses, não tínhamos nem colete a prova de bala. Eu trabalhava apoiando os fiscais de postura, e muitas ocorrências ‘caíam no colo’ da guarda, como briga de gangues. Fazíamos segurança pública, mas não tínhamos estrutura para isso. Além disso, alguns sprays de pimenta apresentaram problemas, e muita gente ficou sem o seu antes de vencer a validade. A falta de condições de trabalho foi a primeira coisa que me fez estudar para sair”, afirma Débora Mara Teixeira Silva, 30 anos, hoje oficial de justiça na Comarca de Rio Pomba.
Vítor de Mello Duarte, 33, também é ex-guarda municipal de Juiz de Fora. Quando passou no concurso, em 2006, já estava formado em direito. Após dois anos na corporação, foi aprovado no concurso para policial civil do Distrito Federal, onde mora há três anos. Hoje é delegado de Ceilândia, cidade satélite de Brasília. Sobre a guarda, ele não fala em sucateamento, mas admite que as condições de trabalho não eram adequadas. “A qualidade de trabalho não era a melhor, apesar de a corporação contar com um corpo profissional qualificado e instruído. Tínhamos todas as condições para desempenhar a nossa função, embora muito aquém para uma cidade do porte de Juiz de Fora”, diz Vítor. A nova lei federal, sancionada pela presidente Dilma Rousseff no mês passado, prevê que o efetivo da Guarda Municipal para cidades acima de 500 mil habitantes, caso de Juiz de Fora, não pode ser menor que 150 e nem maior que mil. Com 115 servidores, a guarda local está abaixo da previsão nacional. Segundo a secretária de Administração e Recursos Humanos, Andréia Goreske, há um planejamento para realização de novo concurso e substituição daqueles que saíram da corporação, o que está em avaliação. “No entanto, considero essa movimentação normal em todas as carreiras. Isso é natural. Mas a gente acha que precisa, sim, manter o nosso quadro. A administração já sinalizou que vai fazer concurso público. Agora só está na tramitação interna.”
Porte de arma
O delegado Vítor de Mello Duarte comenta a antiga polêmica sobre o uso de arma de fogo entre os guardas. A questão divide a opinião de especialistas e da própria população. “Já naquela época, a questão mais polêmica era a do armamento. Mas o nosso curso de formação era bem completo, atendendo a necessidade do uso da arma. Eu me sentia preparado para usá-la”, diz. Nova lei federal, sancionada em agosto pela presidente Dilma, institui normas gerais para as guardas de todo o país e autoriza o porte de arma de fogo para a categoria, estabelecendo prazo de dois anos para que todas as guardas municipais possam se adaptar à legislação.

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