A cada três dias, sindicato da categoria recebe uma denúncia de
agressão física ou verbal contra docentes das redes pública e particular
Por Daniela Arbex
Cada vez mais fragilizada, a relação
aluno/professor teve o medo acrescentado em um de seus componentes. A
cada três dias, o Sindicato dos Professores de Juiz de Fora (Sinpro)
recebe um telefonema com pedido de ajuda de docentes das redes pública e
particular que são alvo de algum tipo de violência física ou verbal não
só de estudantes, mas de seus familiares. A situação também é revelada
pelo Sindicato dos Professores de Minas, que realizou pesquisa sobre a
percepção dos docentes a respeito da violência nos estabelecimentos de
ensino do setor privado no estado. O resultado é que 62% disseram ter
presenciado agressão verbal, 39% relataram ter visto situações de
intimidação e 35% de ameaça. Apesar de ser feito um acompanhamento
momentâneo dos episódios, na maioria dos casos, o desfecho de cada
ocorrência é desconhecido. Na prática, são raras as situações em que há
responsabilização do agressor, com a realização de um trabalho de apoio
para identificação das causas de uma postura violenta e garantia de
suporte que possibilite mudanças de atitude. No final do desgastante
processo de uma ocorrência provocada por desrespeito a quem busca
ensinar, resta a desesperança que deforma ainda mais a imagem da
educação.
Em dezembro do ano passado, a Escola Municipal Antonino Lessa, no
Bairro Santa Efigênia, suspendeu as aulas depois que a diretora e uma
professora foram atingidas a pauladas pela tia de um estudante de 12
anos. Além de atacar as docentes, ela jogou pedras contra a instituição e
quebrou os vidros das janelas. Descontrolada, a mulher cobrava
explicações sobre a agressão ao aluno, após uma briga entre ele e um
colega. O pai de um dos meninos teria atingido o estudante para defender
o filho. Tanto a diretora quanto a professora entraram de licença para
tratamento psicológico.
Há quase seis meses afastada da sala de aula, a professora de
português dos anos finais do ensino fundamental Maria Clara Ferreira
Spínola, 28 anos, chegou a pensar em pedir exoneração do cargo. Desde
que soube que seu aluno teria pedido ao padrasto uma arma para acertar
contas com a professora, chegando também a manifestar desejo de levar
uma faca para a escola, ela perdeu a estabilidade emocional para
continuar. A atitude, que parece exagerada num primeiro momento, afinal o
autor da ameaça tem apenas 12 anos, é justificada por ela como um ato
de preservação. "Não quis virar estatística, já que temos visto muitos
casos nos quais os adolescentes da cidade chegam às vias de fato e
consideram status ostentar toda essa violência. Eles fazem parte de uma
geração perdida. O pior é que a escola tratou o meu caso como isolado.
Os colégios querem responsabilizar o professor pela violência que ele
sofre. A gente é vítima, mas tem medo de virar réu. O que eu lamento é a
falta de ambiente propício para os adolescentes que querem estudar, e
estes são muitos. A maior parte dos alunos tem sede de saber, mas o
potencial deles está sendo desperdiçado", comenta a professora, que está
em tratamento médico desde agosto de 2013, quando o episódio veio à
tona. Ela diz que uma de suas solicitações, a de transferência para
outra escola, ainda não foi atendida pela Superintendência Regional de
Educação (SRE). O pedido, segundo a professora, foi endereçado ao órgão
em outubro do ano passado. A superintendente regional de ensino, Belquis
Furtado, informou que Maria Clara foi nomeada no primeiro semestre do
ano passado e encontra-se em estágio probatório. "Recebi a solicitação
dela em janeiro deste ano e encaminhei para a Secretaria Estadual de
Educação. O caso dela está sob análise."
Agredida com uma cadeira por uma mãe de aluna, uma professora da rede
particular de Juiz de Fora levou alguns anos para superar o trauma de
ter sua dignidade ultrajada. Com pouco apoio da escola, ela se viu sem
ambiente para continuar. Sentiu-se tão pressionada que resolveu pedir
demissão e deixar o local onde foi alvo de violência. Apesar de mudar de
emprego, precisou de tempo para lidar com as lembranças do dia em que
foi atacada. Hoje, atuando em outro colégio particular, ela prefere não
falar sobre o assunto que a fez adoecer.
Também afastada por problemas de saúde há um ano e meio, Fátima
Barcellos, uma das diretoras do Sinpro, diz que a escola virou local de
enfrentamento. "Estamos cada vez mais frágeis diante dos alunos. O que
impera é a busca de resultados rápidos, mas sem que tenhamos qualquer
condição de trabalho. Isso é paradoxal. Além do mais, alunos agressores
têm um histórico familiar comprometido, em função de problemas sociais.
Nos transformamos em reféns dessa estrutura."
Desvalorização
A coordenadora-geral do Sinpro Juiz de Fora, Aparecida de Oliveira
Pinto, mostra-se preocupada com a forma como a educação vem sendo
desenhada. "Falar da violência na escola é falar da violência na qual a
sociedade está mergulhada. Sem políticas para a juventude, muitos
estudantes carregam para o ambiente escolar público os conflitos nos
quais estão mergulhados. Já na rede particular, os alunos repetem em
sala de aula o que a família diz em casa: sou eu quem pago o seu
salário. A violência verbal predomina nas escolas particulares, e o medo
de denunciar e perder o emprego também. Assim, a educação torna-se uma
mercadoria, e o professor um produto."
Para a diretora do Sind-UTE, Victória Mello, a desvalorização do
trabalhador da educação fragiliza o papel do professor. "A criança e o
jovem se referenciam pelo valor social da autoridade, e este valor está
sendo retirado do professor."
Fonte: Tribuna