sábado, 4 de agosto de 2012

Polícia Federal vasculha área de carvoaria

Ação encontra 8 carvoeiros sem luvas em área perigosa. Inquérito apura se há condição 'análoga à de escravo'

Por Daniela Arbex
Agentes federais, com apoio de helicóptero da PM, vistoriaram a área na última quinta-feira
Agentes federais, com apoio de helicóptero da PM, vistoriaram a área na última quinta-feira
Operação realizada pela Polícia Federal com o apoio do Batalhão de Radiopatrulhamento Aéreo da Polícia Militar de Minas Gerais confirmou a existência de trabalho em condições degradantes em carvoaria que funciona na Fazenda Bom Retiro, Zona Rural de Juiz de Fora. A ação aconteceu na manhã de quinta-feira e, além do trabalho de campo realizado por 12 policiais militares e federais, contou com a ajuda de helicóptero da PM, que tinha a função de rastrear outros possíveis focos de produção de carvão vegetal na região. A atividade acontece dentro de área que pertence à Companhia Brasileira de Carbureto de Cálcio (CBCC), cuja controladora é a multinacional Dow Corning Corporation, maior produtor mundial de silicones. Durante o levantamento da Polícia Federal (PF), que contou ainda com a presença de um auditor do Ministério do Trabalho, a delegada da PF Gisele Rezende afirmou ter encontrado 65 fornos em funcionamento e oito homens trabalhando precariamente, inclusive sem luvas, apesar da periculosidade da atividade. A diligência faz parte do inquérito instaurado para apurar a responsabilidade criminal na carvoaria que atende a CBCC. A investigação, iniciada em função de denúncia publicada pela Tribuna em outubro do ano passado, quer apurar se há crime previsto no artigo 149 do Código Penal, que trata da redução de indivíduos "em condição análoga à de escravo".
No ano passado, o jornal identificou que os fornos de alvenaria eram operados manualmente por carvoeiros que trabalhavam mais de dez horas diárias em condições precárias, expostos a fumaça sufocante e ao calor excessivo. Acesos, os fornos podem atingir a temperatura de 450 graus celsius. No momento da inspeção, um caminhão com 12 toneladas de carvão tinha acabado de sair em direção a CBCC, conforme nota identificada pela polícia.
Além de confirmar a existência da atividade de carvoejamento no local, conforme relatado há nove meses pela Tribuna, a delegada recolheu folhas de ponto preenchidas antecipadamente, que incluía horário de entrada, almoço e saída do dia seguinte ao da operação o que, segundo ela, caracterizaria, em tese, crime de falsificação de documento particular. "Também encontramos uma embalagem nova de equipamento de proteção individual que eles tentaram colocar na correria causada pela nossa chegada. Isso indica que eles não usam no dia a dia e também mostra que o material disponível não minimiza os efeitos nocivos da fumaça. Vimos também que os trabalhadores estavam com bota, mas sem luva. Um deles estava com uma máscara totalmente impregnada por dentro e por fora, o que não impedia a entrada dos gases", afirmou Gisele, que deverá concluir o inquérito após o envio de relatório do Ministério do Trabalho.
Segundo a delegada, o livro de registros encontrado no local indicou a existência de 22 funcionários registrados pela empresa Alvino & Araci Prestcarvão Ltda., que explora a atividade na fazenda da CBCC e, por meio de contrato, vende o carvão produzido para a Companhia Brasileira. O diretor da Dow Corning, Sebastião Cunha, informou ontem que o contrato com a Alvino & Araci está prestes a terminar e não será renovado. "Estamos cientes da visita realizada pela polícia na área, mas não recebemos nenhuma comunicação oficial das autoridades. Desde outubro, a CBCC faz auditorias periódicas, não encontrando nada fora da legislação. Nosso entendimento era que essa empresa estava funcionando dentro das normas. Com a finalização do contrato, essa firma não vai mais produzir carvão na Fazenda Bom Retiro", informou, por intermédio da assessoria de imprensa. Sobre o destino da área, a CBCC não adiantou se há futuros projetos para o local.
Fiscalização se estende a outras áreas
Quase um ano depois de denunciar as condições inadequadas na carvoaria que funciona em área da CBCC, pouca coisa parece ter mudado, a não ser pela porteira de entrada da área que agora permanece trancada e com um funcionário munido de rádio, conforme descreveu a delegada Gisele Rezende, responsável pela operação realizada na Fazenda Bom Retiro, em Rosário de Minas, Zona Rural de Juiz de Fora. Após as denúncias da Tribuna, no final do ano passado, o Ministério Público do Trabalho em Minas expediu ofício solicitando ao Ministério do Trabalho fiscalização em todas as áreas de atuação da Companhia Brasileira de Carbureto de Cálcio.
Em 2003, a CBCC foi condenada, pelo Tribunal Regional do Trabalho, em ação civil pública que trata da existência de carvoaria no Norte de Minas Gerais. A sentença impede a empresa de terceirizar o trabalho de carvoejamento. "A empresa poderá vir a ser responsabilizada desde que ela esteja sendo beneficiada pela produção de carvão", explicou o procurador do Trabalho, Roberto Souza. Ontem ele afirmou que vai solicitar cópia do inquérito instaurado pela Polícia Federal, a fim de tomar providências.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários postados pelos leitores deste blog correspondem a opinião e são responsabilidade dos respectivos comentaristas leitores e não correspondem, necessariamente, a opinião do autor do Blog dos Agentes Penitenciários de Juiz de Fora.

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.