sexta-feira, 27 de julho de 2012

Agressão reacende debate sobre abusos no trânsito

Mesmo com identificação da placa do carro de suspeito, Polícia Civil diz que só poderá agir se vítima procurar delegacia

Por Daniela Arbex e Renata Brum/*Colaborou Marcos Araújo
A violência cometida na noite de terça-feira contra um idoso após uma discussão no trânsito provocou comoção na cidade e reacendeu o debate a respeito da responsabilização de pessoas que usam o carro como arma, desrespeitando, principalmente, o direito do pedestre. Apesar de o homem de 72 anos ter sido agredido com um chute no peito após pedir a um motorista a preferência de passagem na faixa de pedestre na esquina das ruas Halfeld com Tiradentes, a Polícia Civil informou que só poderá agir no caso se for provocada, embora a placa do veículo envolvido tenha sido apresentada. A assessoria de imprensa da Delegacia Regional de Polícia Civil informou que, por tratar-se de lesão corporal, cabe à vítima acionar as autoridades, por meio de representação formal, a fim de que alguma providência seja tomada. Além de ter que comparecer à delegacia, o indivíduo vitimizado tem que apresentar boletim de ocorrência sobre o fato. Neste momento, o idoso passa por tratamento médico.
Ontem a Tribuna teve acesso a imagens de circuito interno de TV que mostram o que teria ocorrido segundos antes de o pedestre ser atingido, de surpresa, com um golpe no tórax. O vídeo mostra o possível carro do suspeito, com quem o idoso teria discutido minutos antes, estacionando na Avenida Olegário Maciel. As imagens revelam, ainda, o instante em que um homem desce do veículo e corre em direção à Halfeld. Uma mulher que aparece no carona assume a direção e espera alguns segundos antes de dar partida no carro. O modelo do veículo corresponde à placa anotada por populares. A própria versão de que o autor teria fugido do local e subido, posteriormente, num automóvel conduzido por uma mulher também. Apesar de a agressão ter ocorrido na noite de terça-feira, a ocorrência só foi registrada no final da manhã de quarta-feira.
O jornal localizou o endereço que consta em nome do dono do veículo e esteve no prédio em que ele reside para ouvi-lo. No entanto, a equipe de reportagem foi informada pelo porteiro do imóvel que ninguém estava em casa. Apesar de ter deixado no local contatos telefônicos, não houve retorno até o fechamento desta edição. Ainda abalado, o idoso atingido pelo motorista afirmou que será difícil esquecer o que passou. "Na verdade, o velho não tem vez na sociedade. A gente até aceita, mas perdoar o que houve é meio difícil", desabafa.
Sociedade individualista
Para a professora do Departamento de Ciências Sociais da PUC-MG e especialista em violência no trânsito Andreia dos Santos, o caso reflete a sociedade atual, cada vez mais hierarquizada e individualista. "Essa agressão não está associada somente à violência no trânsito, mas é reflexo de nosso comportamento. O trânsito hierarquiza a sociedade. Quem está no carro se acha melhor do que quem está a pé, sente que tem prioridade, que tem preferência, que tem até direito de agredir pois é melhor. Por isso temos também tantos atropelamentos no Brasil. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é claro: a vida tem prioridade em qualquer situação. Mas não é isso que acontece. Esse caso comprova que a sociedade está tão hierarquizada que o motorista se sente no direito de agredir o idoso que estava na faixa. O mesmo motorista que se acha no direito de parar em fila dupla, de desrespeitar a norma, sente-se no direito de agredir. A solução para isso é só mesmo a educação. Uma palavra batida, mas que deve ser aguçada para que, no futuro, possamos colher frutos na geração de nossos filhos e netos."
Especialista em trânsito e membro da Comissão Municipal de Segurança e Educação no Trânsito (Comset), José Luiz Britto, defende a punição severa para agressões no trânsito e alerta para a necessidade de mais investimentos para a educação dos condutores. "Estamos vivendo uma época de inversão total de valores. Os carros têm hoje mais importância do que os pedestres. Se formos avaliar, os maiores investimentos estão sendo feitos no asfalto e não nas calçadas. Isto está errado. O pedestre deve estar sempre em primeiro lugar. Além disso, há falhas no processo de educação dos condutores. É preciso que o mesmo seja revisto, pois parece que os novos condutores saem das autoescolas sem ensinamento. Para completar, os motoristas juiz-foranos, por si só, são mal-educados, individualistas e o que é pior, agressivos. Diferentes até mesmo dos condutores de cidades maiores, como Rio de Janeiro, que pelo estresse do trânsito, deveriam ser eles os mais agressivos. Aqui, a pessoa entra no carro e se transforma, esquecendo que é também pedestre em outras horas. Esse motorista, que parou o carro e agrediu um senhor com o dobro de sua idade, precisa ser punido efetivamente pela atitude de desrespeito e pela agressão cometida."

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